terça-feira, 29 de maio de 2012

Bicho Papão

Tinha seis anos, era filho único e morava em uma bonita casa de classe média.
Na sua casa ou em qualquer lugar poderia fazer de tudo para chamar a atenção, ser percebido e quem sabe receber um pouco de carinho. Uma palavra dirigida a ele seria o suficiente para acelerar seu coração.
Acordava e se arrumava para ir à escola, abria as cortinas, escovava os dentes, tomava o café, nenhuma palavra lhe era dirigida. Pai, mãe, empregada... Se ao menos tivesse um cachorro quem sabe receberia uma latida.
Ia à escolinha no carro do pai. Silêncio. Nem a rádio tocava.
Chegando lá se sentava em um canto isolado e via todas as crianças a brincar, a rolar de um lado para o outro, correndo histéricas e gritando. Nunca era convidado.
E ao voltar para casa era mais do mesmo, a empregada limpava a casa toda, os pais chegavam e ela saía. Se deitava sem cansaço.
Certa madrugada ainda não tinha dormido. Pensava e pensava na vida, na sua solidão.
Em meio a escuridão profunda de seu quarto ele se aventurou a tentar contato com alguém tão só quanto ele, se esticou, colocou um braço e a cabeça de baixo da cama e disse:
–Hey Sr., você que vive aí em baixo, acho que você também não tem muitos amigos... Quer conversar um pouco?

Sentiu agarrar seu braço, era um pouco áspero mas não dolorido. Hesitou um instante mas não gritou. Foi puxado.
E nunca mais se ouviu falar dele.




Bicho Papão 29/05/2012

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